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Câncer de mama: desigualdade no tratamento compromete chances de cura

No Brasil, 75% da população depende do SUS, com tempos de diagnóstico do câncer de mama variando entre regiões e chegando a 90 dias em algumas

O tratamento do câncer de mama no Brasil é marcado por desigualdades que afetam diretamente as chances de cura das pacientes. De acordo com a Pesquisa Nacional de Saúde de 2019, cerca de 75% da população depende exclusivamente do Sistema Único de Saúde (SUS) para cuidados com a saúde.

“Enquanto o tempo médio para confirmação do diagnóstico de câncer de mama no Brasil é de 36 dias, em alguns estados do Norte, esse período pode ultrapassar 90 dias”, comenta a médica Maira Caleffi, mastologista, chefe do serviço de Mastologia do Hospital Moinhos de Vento e presidente voluntária da Federação Brasileira de Instituições Filantrópicas de Apoio à Saúde da Mama (Femama).

Embora o direito à saúde seja universal, o acesso ao tratamento oncológico é desigual. “Nem todas as regiões do país possuem mamógrafos ou serviços de biópsia”, explica Caleffi. Esse problema é agravado pela alta demanda e longas filas de espera em várias partes do Brasil, especialmente nas regiões Norte e Nordeste.

O início do tratamento também é preocupante, com uma média de 174 dias no SUS, mais que o dobro do prazo estipulado pela lei dos 60 dias. “Em alguns estados do Norte, esse intervalo pode chegar a 270 dias, comprometendo as chances de cura”, adverte.

Além disso, de acordo com a médica, muitas mulheres não recebem o tratamento adequado para seu tipo de tumor. “Isso pode ocorrer devido à indisponibilidade de medicamentos no SUS, à resistência dos planos de saúde em liberar o acesso ao tratamento ou à demora no atendimento, fatores que comprometem o sucesso terapêutico”, alerta.

Disponibilidade desigual

Outro problema é a disponibilidade desigual de tratamentos específicos para diferentes tipos de câncer de mama. “Dependendo do tipo de tumor, muitas mulheres não têm acesso ao tratamento mais adequado, seja pela falta de medicamentos no SUS, pela resistência dos planos de saúde ou pela demora no atendimento”, explica a médica.

Além disso, relata que ainda há falta de preparo de alguns profissionais da saúde, especialmente na atenção primária, em reconhecer os sintomas da doença, principalmente em mulheres jovens.

“Muitas mulheres, especialmente as jovens, enfrentam dificuldades para ter seus sintomas levados a sério. Mesmo após o diagnóstico, muitas delas não são corretamente encaminhadas para a continuidade do tratamento, que envolve cirurgias, quimioterapia, radioterapia ou hormonioterapia.”

Segundo Caleffi, cada caso é único, e o tratamento precisa ser individualizado, levando em conta tanto as características da paciente quanto as do tumor.

Desigualdades regionais

Uma pesquisa da Organização Mundial da Saúde (OMS) aponta que mulheres em países com Índice de Desenvolvimento Humano (IDH) mais baixo têm 50% menos probabilidade de serem diagnosticadas com câncer de mama em comparação com aquelas de países com IDH mais alto.

No Brasil, essa realidade é refletida nas dificuldades de acesso ao diagnóstico e tratamento nas regiões mais carentes. “As áreas urbanas e próximas ao litoral concentram mais mamógrafos e profissionais capacitados. Já em regiões mais afastadas, muitas mulheres começam o tratamento com a doença em estágio avançado”, lamenta a especialista.

Dados do Radar do Câncer mostram que, nos últimos três anos, 54,3% das mulheres iniciaram o tratamento no SUS com a doença já em estágio avançado. Além disso, a falta de acesso à informação é outro fator de risco, especialmente entre as populações mais vulneráveis.

“Mulheres com menor escolaridade têm maior probabilidade de morrer em decorrência do câncer de mama, em parte por falta de conhecimento sobre a doença e sobre os serviços de saúde disponíveis.”

Barreiras ao acesso à informação

A desigualdade no acesso à informação também agrava o cenário. “Muitas pessoas no Brasil acessam a internet apenas por meio de pacotes de dados limitados, e mesmo quando a informação está disponível, ela nem sempre é acessível e compreensível”, afirma Caleffi. A médica ressalta a importância de campanhas como o Outubro Rosa, que buscam ampliar o acesso à informação de forma clara e inclusiva, especialmente para as populações mais vulneráveis.

A médica Larissa Oliveira de Aquino, mastologista da Sociedade Brasileira de Mastologia (SBM), afirma que as desigualdades sociais e regionais no Brasil formam barreiras que prejudicam a detecção precoce, a qualidade do tratamento e a sobrevida das pacientes.

“As diferenças tecnológicas e de conscientização entre regiões mais desenvolvidas e aquelas em situação de vulnerabilidade acentuam ainda mais essa problemática. Enquanto algumas mulheres têm acesso a serviços de saúde eficientes, outras enfrentam dificuldades para realizar exames preventivos e obter o tratamento necessário.

Na sua opinião, para garantir um acesso mais equitativo aos serviços de saúde, é fundamental implementar políticas públicas que melhorem a infraestrutura e o atendimento em todo o País. Isso inclui campanhas contínuas de conscientização sobre a importância da detecção precoce do câncer de mama, além da ampliação da disponibilidade de tecnologias e medicamentos avançados no SUS.

A redução das desigualdades regionais e socioeconômicas é outro aspecto apontado pela médica para aumentar as chances de cura e melhorar a qualidade de vida das mulheres brasileiras afetadas pela doença.

A importância dos exames de rotina

O médico Cleydson Santos, oncologista clínico e coordenador do serviço de Oncologia do Hospital Mater Dei, diz que é fundamental que a mamografia seja feita anualmente a partir dos 40 anos. Para aquelas com histórico familiar, o rastreamento deve começar aos 35 anos. “O autoexame não substitui a mamografia, pois o médico é capaz de detectar alterações com mais precisão”, ressalta.

Santos diz que os sintomas iniciais incluem nódulos palpáveis, alterações na textura da pele e secreções no mamilo. “Com o diagnóstico precoce, as chances de cura são significativamente maiores, e mesmo em casos avançados, é possível um tratamento eficaz que melhora a qualidade de vida”, acrescenta.

As opções de tratamento incluem quimioterapia, que pode ser realizada antes ou depois da cirurgia, e medicamentos hormonais, como o Tamoxifeno, que bloqueia o estrogênio. Além disso, avanços em terapias específicas para o câncer HER2 positivo têm proporcionado melhorias significativas, com medicamentos disponíveis no SUS.

Conforme Santos, as cirurgias de mama se tornaram menos invasivas, focando em preservar a maior parte do tecido mamário possível e considerando a estética. A radioterapia, por sua vez, evoluiu para minimizar os efeitos colaterais, protegendo órgãos adjacentes enquanto trata a área afetada.

Créditos:

Lisiane Mossmann

Fotos:

Freepik / Divulgação / Correio do Povo

Fonte:

Correio do Povo

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